segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Capital social e desenvolvimento sustentável: o oeste do Paraná em pauta

 Capital social e desenvolvimento sustentável: o oeste do Paraná em pauta

Josieli Santini[1]

O desenvolvimento sustentável, apesar de ser amplamente debatido no século XXI, é um tema recente na agenda das Nações Unidas. O conceito clássico remonta ao Relatório idealizado pela norueguesa Gro Harlem Brundtland, Nosso Futuro Comum de 1991. Segundo esse relatório (1991), o desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que atende as necessidades das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades.

Como resposta à tentativa de trazer à tona uma nova forma de desenvolvimento, cabe pontuar a Conferência Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, também conhecida como Cúpula da Terra ou Rio 92, que ocorreu no Rio de Janeiro, em 1992. O encontro teve como consequência, dentre outras, a Declaração do Rio, que estabeleceu o desenvolvimento sustentável como sendo aquele que possui três dimensões interligadas: a social, a econômica e a ambiental. Em outras palavras, a proteção ambiental não poderia ocorrer sem que houvesse inclusão social, combate às desigualdades e crescimento econômico.

Assim surge a Agenda 21, predecessora da Agenda 2030, com o intuito de enfrentar os desafios consequentes de um modelo de desenvolvimento insustentável. A agenda foi acompanhada do estabelecimento de 8 objetivos, chamados de Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Estes prevaleceram entre 2000 e 2015 e foram o primeiro arcabouço global para políticas públicas de desenvolvimento e se mostraram como mecanismo eficaz para perseguir a sustentabilidade.

Entretanto, haviam dois processos em paralelo, processos que deveriam andar juntos: os ODM com foco principal na dimensão social e o desenvolvimento sustentável com foco na sustentabilidade ambiental. Como vimos, o conceito de desenvolvimento sustentável possui tripés alicerçados na inclusão social, no crescimento econômico e na proteção ambiental. Sendo assim, viu-se a necessidade de tratar os objetivos e a própria agenda de modo holístico, abarcando não somente a dimensão social, mas também a econômica e a ambiental. A esses três pilares, ainda, deve-se acrescentar a dimensão institucional, que diz respeito sobre as questões de governança, participação de grupos de interesse e da sociedade civil organizada como parceiros imprescindíveis na promoção de um desenvolvimento sustentável (DUQUE, 2013).

Neste contexto de integração ambiental, econômica e social temos, em 2015, a implementação da Agenda 2030, cujo lema é “Não deixar ninguém para trás”. Com o propósito de traçar um plano de ação para a comunidade internacional, governos locais e população, temos a constituição de 17 objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS), acompanhados de 169 metas que vigorarão até 2030. O princípio da Agenda, em conformidade com o lema, é a universalidade do alcance das políticas, ou seja, pretende-se contemplar as pessoas independente de etnia, cor ou gênero, através de parceria multisetoriais.

No entanto, a universalidade não quer dizer que as políticas precisam ser uniformes. Em outras palavras, os ODS são globais e ideais e não existe uma única fórmula para a implementação. O Brasil é um país de dimensões continentais e diversidade sociocultural e, por conseguinte, exige uma adaptação dos ODS e suas respectivas metas. Em outras palavras, cada país tem acesso aos ODS e cabe às autoridades adaptarem eles para a realidade local.

 É deste modo que ocorre a localização ou territorialização dos ODS. Localização é o processo de levar em consideração contextos subnacionais, como municípios e estados, a fim de que a Agenda alcance todas as realidades (UNITED NATIONS HABITAT, tradução nossa, 2016). No Brasil o órgão responsável por adaptar os ODS à realidade local é o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Com o alinhamento dos objetivos e metas à realidade local, os formuladores de políticas têm à sua disposição um mapa para guiar as ações na mesma direção.

A localização dos ODS tem a missão de aproximar governos, sociedade civil e setor privado, ampliando a pluralidade na participação política e ações decisórias. Para isso, a cooperação e associação entre esses atores são necessárias para que a Agenda 2030 seja implementada e alcance, principalmente, as pessoas que estão em vulnerabilidade. Neste contexto, o ODS 17 se traduz nas maneiras com que as parcerias e os meios de implementação podem ser concretizados. Em outras palavras, “para haver desenvolvimento local é necessário que se criem redes sociais que promovam confiança, cooperação e responsabilidade” (DUQUE, 2013, p. 4)

Um caso de sucesso no que tange a parceria para a implementação dos ODS em âmbito subnacional é o programa Oeste 2030. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) firmou parceria com a Itaipu binacional para sensibilizar a comunidade local e promover o cumprimento dos ODS no oeste do estado do Paraná. O projeto com foco na segurança hídrica contempla 54 municípios do estado e tem participação do setor público na figura das prefeituras, do setor privado representado pelas associações comerciais e cooperativas (CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS, 2019). Além disso, conta com o apoio e investimento da Itaipu binacional.

O relatório Panorama ODS: Oeste do Paraná em Números[2] é documento fruto da parceria multisetorial no oeste do Paraná. A ideia é levantar dados e sofisticar os indicadores para alcançar de forma mais abrangente e participativa os ODS na região. De acordo com o diretor de coordenação da Itaipu Binacional, Newton Kaminski, o projeto é importante também para o Brasil, pois a territorialização dos ODS colabora para que haja maior profundidade nas ações em prol do desenvolvimento sustentável, visando o bem-estar de todos os envolvidos (PNUD, 2019). Nesse caso, Buarque (2002 apud BILERT et al., 2011) destaca que o desenvolvimento local requer iniciativas e mobilização da sociedade em prol de um projeto coletivo.

Assim sendo, o processo social que tem como resultado o bem da coletividade, com base na confiança, reciprocidade e solidariedade é definido pelo cientista político Robert Putnam como capital social (PASE, 2006). O capital social proporciona o engajamento das sociedades em redes e auxilia na articulação de mudanças sociais significativas (ROCHA et al., 2017). A sustentabilidade visa romper o padrão de desenvolvimento que tem procedentes no uso desenfreado dos recursos naturais e o caso paranaense evidencia como a cooperação entre diversos atores em prol de um bem comum pode se transformar em um instrumento para alcançar o desenvolvimento territorial sustentável (MORAES, 2003).

 

Bibliografia

BRUNDTLAND, Gro Harlem. Nosso futuro comum: comissão mundial sobre meio ambiente e desenvolvimento. 2.ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991.

DUQUE, Eduardo. Capital social como instrumento de desenvolvimento sustentável. Revista Configurações[online], 11, 2013. Disponível em: https://journals.openedition.org/configuracoes/1862. Acesso em 28/09/2020.

ROCHA, Clarissa Maria Ramalho Sá, et al. O desenvolvimento de políticas públicas e a influência do capital social na construção do desenvolvimento local sustentável. Revista Brasileira de Gestão Ambiental e Sustentabilidade, v.4, nº 8, p. 463- 474, 2017.

            UNITED NATIONS HABITAT. Roadmap for localizing the SDGs: implementation and monitoring at subnational level. Disponível em: https://unhabitat.org/roadmap-for-localizing-the-sdgs-implementation-and-monitoring-at-subnational-level. Acesso em: 28/09/2020.

            CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Relatório aponta que oeste do Paraná avançou no cumprimento de metas da ONU. 2019. Disponível em: https://www.cnm.org.br/comunicacao/noticias/relatorio-aponta-que-oeste-do-parana-avancou-no-cumprimento-de-metas-da-onu. Acesso em: 28/09/2020.

            PASE, Hemerson Luiz. Capital social e desenvolvimento: a experiência do Rio Grande do Sul. Pelotas: Editora UFPel, 2016.

            MORAES, Jorge Luiz Amaral de. Capital social e desenvolvimento regional. In: Correa, S. M. S. (Org.). Capital social e desenvolvimento regional. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2003.

            PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Projeto Oeste 2030 lança diagnóstico para estimular municipalização dos ODS no Oeste do Paraná. 2019. Disponível em: https://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/presscenter/articles/2019/projeto-oeste-2030-lanca-diagnostico-para-estimular-municipaliza.html . Acesso em: 28/09/2020.

BILERT, Vania Silva de Souza et al. A contribuição do capital social para o desenvolvimento local sustentável. Ciências Sociais Aplicadas em Revista, v. 11, nº 21, p. 29-42, 2011.

 



[1] Graduanda em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG e pesquisadora voluntária do Núcleo de Estudos em Políticas Públicas e Opinião – NEPPU/FURG. E-mail: jsantini@furg.br

²https://oestepr2030.org.br/2018/11/20/diagnostico-da-regiao-oeste-do-parana/

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