quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Reflexões sobre a transparência pública em tempos de pandemia

 Reflexões sobre a transparência pública em tempos de pandemia

Márcia Leite Borges

 Acesso à Informação é um elemento importante para a materialização da participação do cidadão na sociedade brasileira, através dele é possível o controle social. Além disso, a informação é um direito fundamental, estando expressa no artigo 19 da Declaração Universal das Nações Unidas (2009) e no artigo 10 da Convenção da Nações Unidas contra a Corrupção (2007). No Brasil, a Constituição Federal de 1988 incorporou o direito ao acesso à informação regulamentado através da Lei nº 2.527/2011.

Nesse contexto de pandemia, a transparência governamental exerce um papel protagonista, principalmente nas ações vinculadas ao Sistema Público de Saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou ainda em janeiro de 2020 que os governos deveriam primar pela transparência nas ações de enfrentamento da COVID-19. Por essa razão, refletir sobre o que é de fato transparência na gestão pública se mostra muito relevante.

É possível ver a transparência governamental como a disponibilização das informações públicas como também a apresentação de ferramentas para a solicitação daquelas não estão disponíveis, tendo em conta que nem toda a informação pública pode ser encontrada na internet. Contudo, não só isso, a transparência se relaciona, também, com a preocupação quanto à qualidade na produção da informação pública. Isso, porque, a informação sem qualidade é inútil ou até mesmo prejudicial quando utilizada para embasar uma tomada de decisão.

O marco legal do Brasil ao acesso à informação é a Lei nº 12.527/2011, denominada de Lei de Acesso à Informação (LAI). Ela regulamenta o direito previsto na Carta Magna de o cidadão solicitar e receber informações de todos os poderes a respeito da “coisa” pública. A LAI é uma das legislações mais avançadas no contexto do acesso à informação sobre a gestão pública à nível mundial, em que pese a existência da Lei Complementar 131/2009 conhecida como a Lei da Transparência, foi a LAI que realmente implantou uma cultura de transparência na ações e finanças públicas no país.

A LAI trouxe modificações importantes com novas regras no que tange a classificação e o sigilo de documentos e informações além especificar os respectivos graus de sigilo. Um dos diferenciais da lei brasileira é a necessidade de os dados e informações serem disponibilização em formato que possibilite a leitura por interfaces computacionais (dados abertos) e não apenas por pessoas. Além disso, fica determinado que os órgãos e entidades devem divulgar proativamente suas informações na internet independentemente de requisição. Esse tipo de transparência é denominado ativa.

A transparência ativa ocorre quando a divulgação dos dados é feita por iniciativa do próprio setor público independente de requerimento. Essa forma de disponibilização além de facilitar o acesso à informação desejada reduz o custo da prestação de informações, além de evitar o acúmulo de pedidos.

Existe também a transparência passiva, onde se criam meios para que o cidadão possa solicitar as informações que não estiverem proativamente disponíveis e que não exijam sigilo por previsão legal. No sentido de possibilitar a transparência passiva a LAI instituiu a criação de Serviço de Informação ao Cidadão (SIC), responsável pelo atendimento às requisições de informação. Esse serviço deve ser gratuito, não havendo necessidade de justificar o pedido. Contudo, se o órgão negar a informação, este deve justificar a recusa.

Em meio a pandemia, o acesso à informação tem se configurado em um poderoso instrumento de controle social, ou seja, um conjunto de mecanismos que cada sociedade possui para garantir e normatizar o comportamento do ente público, possibilitando a intervenção para uma postura ética aceitável. Nesse sentido, com a necessidade da adoção de medidas emergenciais na contenção da COVID-19, como a flexibilização das regras de licitação e contratações públicas (Lei Federal nº 13.979/2020, complementada pelas Medidas Provisórias nº 926 e 951 de 2020), mais do que nunca o acesso à informação é primordial para o controle social do mal uso e/ou desvio dos recursos públicos.

Mas não é isso que se tem observado, como demonstrou o estudo da Transparência Internacional (2020), apresentado no documento “Ranking de Transparência em Contratações Emergenciais” que analisou os portais de transparência dos estados brasileiros, do Distrito Federal e do Governo Federal quanto aos gastos na contenção da pandemia. Para espanto, o Governo Federal ficou em 26º colocado quanto a transparência em contratações emergenciais, ficando à frente, somente, do estado de Roraima (último colocado no ranking). Isso, demonstra que ainda não há uma preocupação de fato por parte do governo federal em expor, de forma clara e acessível, a distribuição de seus recursos.

Referência bibliográfica:

BRASIL. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º , no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>.

BRASIL. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13979.htm>

ONU – Organização das Nações Unidas. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. 2007. Disponível em: <https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil/Topics_corruption/Publicacoes/2007_UNCAC_Port.pdf>.

ONU – Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos. UNIC/Rio/005. Janeiro, 2009. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf>.

TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL. Ranking de Transparência em Contratações Emergenciais. 2020. Disponível em: <https://

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